CapaCidadeDigitalEconomiaEm focoMesser 20 anosPolíticaSaúde
Notícias

Editorial - Nas entrelinhas do julgamento

Editorial de abertura do Programa João Paulo Messer 03/09/2025

03 Setembro 2025 | Quarta-feira 10h00
O primeiro dia do julgamento de Jair Bolsonaro no caso dos atos de 8 de janeiro mostrou aquilo que muitos já sabiam: não se discute mais se o ex-presidente será condenado, mas apenas qual será o tamanho da pena.
 
A sentença parece escrita desde antes de o processo entrar em pauta. Essa constatação não diminui a gravidade do que está em julgamento, mas evidencia que o STF, de maneira clara, assumiu um papel que vai além do jurídico ? é um julgamento de natureza política.
 
É comum ouvir críticas de que os ministros transformam a Corte em um palco de espetáculo. Há verdade nisso, mas seria injusto fingir que Bolsonaro é uma vítima passiva desse enredo. Ao contrário: ele sempre soube manipular o teatro da política, alimentar plateias com frases de efeito, desafiar instituições em público e usar cada gesto como provocação.
Agora, vê-se diante de um tribunal que também entende a força simbólica do espetáculo e joga no mesmo terreno.
 
Não há como separar o que está em debate no plenário daquilo que sempre esteve no jogo político do bolsonarismo. Se o julgamento ganha contornos de show, é porque o próprio réu nunca perdeu a chance de transformar sua vida pública em um ato contínuo de performance. O STF apenas devolve, em outra escala, a mesma lógica que sustentou o ex-presidente diante de seus apoiadores.
 
O que se assiste, portanto, é menos uma batalha jurídica e mais um capítulo de afirmação de poder. O Supremo quer deixar sua marca na história, fixar um limite e reafirmar que a democracia brasileira não pode ser colocada em xeque sem consequências. Ao mesmo tempo, sabe-se que cada voto proferido carrega a mensagem de que ninguém está acima das instituições ? nem mesmo quem já ocupou o Palácio do Planalto.
 
Resta, assim, a expectativa: qual a pena? Se será exemplar ou simbólica, dura ou apenas protocolar. O destino da narrativa política de Bolsonaro está em jogo, mais até do que sua vida prática.
Mas, como em todo grande espetáculo político brasileiro, é preciso relativizar o impacto. O julgamento mobiliza manchetes, inflamam-se paixões e multiplicam-se análises. Porém, fora das salas do Supremo, o Brasil segue.
 
A economia não para, a vida cotidiana corre, e o país continua, como sempre, tentando se equilibrar entre crises institucionais e a necessidade de tocar em frente. No fim das contas, o show é deles, mas a vida é de todos nós.
João Paulo Messer
Jornalista